A HISTÓRIA DA FRELIMO REESCRITA: A LUTA DE LIBERTAÇÃO NACIONAL

Evocando os Heróis de 25 de Setembro no 58º Aniversário da Luta de Libertação Nacional

Para resolver a crise de liderança suscitada pela fusão dos três movimentos de libertação nacional – nomeadamente UDENAMO, MANU e UNAMI – o Dr. Eduardo Chivambo Mondlane, um antropólogo moçambicano que viveu e trabalhou nos Estados Unidos da América durante muitos anos, foi visto como o candidato certo, pois não estava associado a nenhum desses três movimentos.

No livro “O Meu Coração Está nas Mãos de um Negro”, a Senhora Dona Janet Mondlane deu a entender que o Presidente Julius Nyerere da República de Tanganica (estado que existiu antes de se unir com Zanzibar em Abril de 1964 e tornar-se Tanzânia) queria que o seu marido, Dr. Eduardo Mondlane, se encarregasse de liderar a frente unida dos três movimentos.

 “Julius Nyerere estava interessado em ver paz nas fileiras dos moçambicanos a quem deu hospitalidade no seu país e queria que Eduardo Mondlane se encarregasse dessa tarefa”.

DIVERGÊNCIAS NO SEIO DIRIGENTE DA FRELIMO

Note-se, no entanto, que o Dr. Mondlane não era bem visto pelos líderes dos três movimentos. Em várias ocasiões, durante a sua liderança, esses líderes, bem como outros líderes nacionalistas, orquestravam planos para derrubá-lo do poder. Eles não apenas o viam como um outsider, mas estavam contra as suas constantes deslocações ao exterior, pois as pessoas em quem ele confiava para dirigir o movimento no dia-a-dia na sua ausência nem sempre agiam no melhor interesse da Revolução Moçambicana. Importa referir que, como professor da Universidade de Syracuse, o Dr. Mondlane mantinha-se afastado da sede do movimento durante muitos dias, por vezes durante três ou mais meses consecutivos.

Em menos de dois meses após a recém-criada Frente Unida denominada FRELIMO, especificamente em 20 de Agosto de 1962, o Presidente da UDENAMO Adelino Gwambe – que havia sido declarado persona non grata em Tanganica quando partiu para a Conferência de Moscou – ressurgiu no Cairo, acompanhado pelo líder da MANU, Matthew Mmole. Os dois homens emitiram um comunicado conjunto pelos microfones da Rádio Cairo, denunciando o Dr. Mondlane como um “fantoche capitalista” e “Tshombe” de Moçambique. Por esta acção “traiçoeira”, Matthew Mmole foi expulso do movimento da FRELIMO. Por sua vez, o seu Secretário-Geral, Lawrence Malinga Millinga, foi expulso por ter escrito uma carta aberta a G. Mennen Williams, Secretário de Estado Adjunto dos Estados Unidos da América, denunciando a inconsistência entre a posição pública dos Estados Unidos sobre África e seu voto anti-liberdade nas Nações Unidas.

Após a sua expulsão, os dois antigos dirigentes da MANU condenaram o critério usado pela liderança do movimento da FRELIMO para atribuir cargos. Eles observaram que o mesmo era baseado no tribalismo e no nepotismo, com todos os cargos mais altos indo para ex-membros da UDENAMO, que eram em sua maioria da Região Sul de Moçambique. Note-se que o Presidente da UNAMI, Baltazar da Costa Chagonga, também se queixou de tribalismo e de nepotismo na FRELIMO quando decidiu abandonar o movimento no final de 1963.

Leo Milas, o primeiro da esquerda, com Armando Quembo e Fanuel Mahluza em sua casa em Nairobi.Fonte:Dr. Antonio Disse Zengazenga

Surpreendentemente, os dois homens que o Presidente Mondlane nomeou para representá-lo no dia-a-dia na sua ausência tentaram destroná-lo do poder a 3 de Outubro de 1962. David Mabunda e Paulo Gumane, entre outros líderes nacionalistas, acusaram o Dr. Mondlane de “ser antipatriota, de viver longe da frente de batalha e de se casar com uma americana  branca”.

Refira-se que foi esta rebelião que prontou o Dr. Mondlane a enviar o Leo Milas a Dar-es-Salaam em 4 de Novembro de 1962. Durante o período que esteve a liderar a frente unida em representação do Presidnte Mondlane, Milas impunha a sua presença, expulsando do movimento todos aqueles que supostamente causassem problemas.

Mais tarde, o Presidente Mondlane reconheceu que David Mabunda e Paulo Gumane estavam a causar danos ao alegar  que    ele   e   Leo  Milas  eram “agentes da CIA”. Em face dessa situação, ele foi forçado a terminar prematuramente o seu contrato com a Universidade de Syracuse e a regressar a Tanganica em Março de 1963.

FORMAÇÃO DE INSTRUTORES MILITARES

No âmbito do programa geral da luta pela independência de Moçambique, o Primeiro Congresso da FRELIMO mandatou o Comité Central para criar um exército de libertação nacional. Neste contexto, a liderança da FRELIMO pediu ao governo argelino que ajudasse a treinar militantes da FRELIMO em técnicas de guerrilha e de sabotagem.

Filipe Samuel Magaia. Fonte: Centro de Documentação e Formação Fotográfica, Maputo

Assim, o primeiro grupo de cerca de 50 moçambicanos partiu para Argélia no início de Janeiro de 1963, seguindo-se outros dois grupos com mais de 70 militantes cada. Filipe Samuel Magaia que cumpriu serviço militar no exercito colonial português, tendo ascendido ao grau de alferes, liderou o primeiro de três grupos de militantes da FRELIMO que foram enviados à Argélia para se submeterem a um curso de formação militar. Após o regresso do seu grupo a Tanganica em Junho de 1963, Filipe Magaia foi nomeado Secretário do Departamento de Defesa e Segurança, em substituição de João Mungwambe.

Em Maio de 1964, Magaia foi enviado à China para aprofundar os seus conhecimentos político-militares, na companhia de outros militantes da FRELIMO que incluíam Sebastião Marcos Mabote, José Macamo, Francisco Kufa, Francisco Manyanga e José Moiane. Enquanto isso, outros grupos de militantes foram enviados à União Soviética e ao Egipto com o mesmo propósito.

Depois de regressar permanentemente a Tanganica, o Presidente Eduardo Mondlane visitou a Embaixada Americana em Dar-es-Salaam em Junho de 1963. Durante a sua visita, informou aos funcionários da Embaixada que o seu movimento daria prioridade à acção política. Acrescentou, no entanto, que se não houvesse progresso no campo diplomático, os militantes moçambicanos formados na Argélia seriam utilizados como instrutores nos campos de treino militar a estabelecer em Tanganica e o seu movimento iria recorrer à luta armada.


NB: Pode ler este e outros artigos relacionados no https://umpadrevolucionario.com/language/pt/

As referências bibliográficas e notas finais deste artigo foram omitidas. Uma referência detalhada pode ser encontrada na segunda edição do livro “Mateus Pinho Gwenjere – Um Padre Revolucionário” a partir do qual este artigo foi extraído. O livro encontra-se à venda nas livrarias das cidades de Maputo e Beira.